Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

© 2005 Sophie Weston. Todos os direitos reservados.

O FEITIÇO DO XEQUE, N.º 1326 - Maio 2012

Título original: In the Arms of the Sheikh

Publicado originalmente por Mills & Boon®, Ltd., Londres.

Este título foi publicado originalmente em português em 2006

Todos os direitos, incluindo os de reprodução total ou parcial, são reservados. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Enterprises II BV.

Todas as personagens deste livro são fictícias. Qualquer semelhança com alguma pessoa, viva ou morta, é pura coincidência.

® Harlequin, logotipo Harlequin e Bianca são marcas registadas por Harlequin Books S.A.

® e ™ São marcas registadas pela Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença. As marcas que têm ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

I.S.B.N.: 978-84-687-0271-1

Editor responsável: Luis Pugni

ePub: Publidisa

Capítulo 1

«Nova Iorque é um paraíso para as pessoas que têm insónias», pensou Natasha Lambert. «A cidade que nunca dorme. Vamos lá ver!»

Natasha esborrachou o nariz contra a janela do quarto do vigésimo andar do hotel e olhou para baixo. O céu de novembro estava totalmente escuro. Eram cinco horas da manhã. No entanto, havia carros com as luzes acesas à chuva e pessoas nas ruas.

Quem seriam? Pessoas que iam trabalhar? Pessoas que regressavam depois de uma noite de festa?

Natasha viu que saía um casal do hotel e que um empregado carregava as suas malas até um táxi.

Um casal…

Voltou rapidamente para o extraordinário escritório de executivo que a tinha levado a reservar quarto naquele hotel luxuoso. Embora naquele momento não tivesse aspeto de executiva, pensou e sorriu ao olhar para as pantufas em forma de gato.

O seu computador portátil estava ligado sob a luz do candeeiro. Natasha sentou-se e mexeu os pés nervosamente, enquanto pensava em que cor dar aos diapositivos da apresentação.

Azul? Demasiado frio. Vermelho? Demasiado agressivo.

«Como eu», pensou Natasha. Antes de acabarem, o seu último namorado dissera-lhe que ela não tinha coração. Quando lhe dissera que tinha razão, o coitado quase enlouquecera.

– Não é um elogio – tinha esclarecido o seu namorado.

– Talvez não para ti. Contudo, eu trabalhei muito para chegar aqui.

O rapaz fora-se embora, furioso.

O telefone tocou. Sem desviar o olhar do ecrã, Natasha atendeu-o.

– Sim?

– Posso deixar uma mensagem para Natasha Lambert, por favor?

Natasha sorriu.

– Sou eu. Olá, Izzy!

– Oh, não!

Natasha sorriu mais. Izzy Dare era a sua melhor amiga.

– É muito lisonjeador que me digas isso – comentou Natasha. – Não vais falar mais, Izzy? O que é que eu fiz?

Izzy tinha demasiados remorsos para se rir.

– Tentei deixar-te uma mensagem através da rececionista. Não queria acordar-te…

– Não me acordaste.

Natasha mexeu o rato pelo ecrã. «Vermelho e azul, talvez?», pensou, olhando para o ecrã. Afinal de contas, o frio e o agressivo em conjunto normalmente tinham sucesso nos negócios… Podia ser uma mulher sem coração, porém, tinha muito sucesso.

Há muito tempo que deixara de se importar com o que as pessoas diziam sobre ela. Não fazia mal desde que dissessem que tinha feito o seu trabalho e diziam-no.

– Em que posso ajudar-te, Izzy?

Izzy continuava preocupada.

– A sério que não te acordei? Achei que Nova Iorque tinha cinco horas a menos do que Londres… Que horas são aí?

Natasha desviou o olhar do ecrã e olhou para o seu relógio.

– Cinco da manhã.

– E estás acordada? – horrorizou-se Izzy.

– A Prospeções Lambert nunca dorme – respondeu Natasha.

– Porquê?

– Tenho um pequeno-almoço de negócios com o diretor de uma empresa. Marcaram-no à última hora, portanto, estou a rever a apresentação do trabalho.

– É simpático?

– Quem?

– O diretor.

Natasha riu-se à gargalhada.

– David Frankel é baixinho, gordo, viciado no trabalho e um pouco enfadonho, se o deixarmos aproximar-se – respondeu Natasha.

– Parece horrível.

– É por isso que é o diretor. Os homens poderosos são horríveis. É uma característica que os define – Izzy protestou, mas Natasha não se alterou. – Sei o que digo. Trabalho sempre com homens poderosos. Dão muita luta. Eu não gostaria nada de ter uma relação com algum deles. Porém, à parte isso, são aceitáveis. Dizem o que querem.

Izzy pareceu incomodada.

– Trata-se do fim de semana…

– Oh, sim! Não vejo a hora de chegar. Preciso de descansar. Umas gargalhadas numa festa só de raparigas vão calhar muito bem. Sobretudo, depois da semana que passei – houve um segundo de pausa. – O que se passou com o fim de semana? – perguntou Natasha.

– Houve uma mudança de planos.

Natasha suspirou.

– Suspendeu-se por causa da chuva? É uma pena… Teremos de aceitar que nos devolvam o dinheiro, suponho…

– Não, não se trata desse tipo de troca. Trata-se de outra coisa.

– Está bem. Para onde vamos?

– Bom… – Izzy parecia incomodada. – É uma casa particular. Digamos… que ma emprestaram.

– Está bem. Dá-me a morada.

Izzy deu-lha.

– Há mais uma coisa… – acrescentou Izzy.

Finalmente, a insegurança de Izzy teve efeito. Natasha parou de mexer o rato e exclamou:

– Vá lá, Izzy! Di-lo de uma vez. Qual é o problema? A casa vai cair? Não há aquecimento central? Está tão escondida no campo, que tenho de alugar um helicóptero para lá chegar?

– Serias capaz de o fazer – replicou Izzy.

– O que for preciso… Um por todos e todos por um. Tu és a minha melhor amiga e há seis meses que não te vejo – Natasha largou o rato do computador. – Terei de procurar um piloto?

– Não. É uma hora de carro desde o aeroporto.

– Então, não há problema.

– Está bem, continua a trabalhar. Vemo-nos amanhã. Vens de noite, não vens?

– Sim.

– Ótimo! Assim teremos todo o dia para conversar antes que cheguem os outros convidados.

Natasha franziu o sobrolho. Aquilo parecia sério.

– Estás metida em algum sarilho, Izzy?

A sua amiga riu-se.

– Não, não… É só que… Serenata Place é um pouco difícil de encontrar… – Izzy parecia querer dizer-lhe alguma coisa, porém, não tinha coragem. – Enviar-te-ei um mapa por e-mail – acrescentou, com entusiasmo.

Natasha voltou a franzir o sobrolho. O tom de Izzy era estranho. Nunca a tinha ouvido a falar daquela maneira. Pelo menos, não desde que…

Natasha tentou afastar as más recordações. Aqueles tempos já tinham passado. Izzy e ela tinham saído vivas da selva, tal como os outros. O importante era que aquele inferno tinha acabado bem. Com o tempo, os pesadelos também desapareceriam.

No entanto, isso não explicava aquele tom artificial de Izzy.

Natasha perguntou-lhe abruptamente:

– O que se passa, Izzy?

Izzy fez um som estranho, uma mistura entre uma gargalhada e um soluço.

– Vou casar-me.

– O quê?

– Vou casar-me. Eu sei, eu sei… É um pouco precipitado. Tu não o conheces. Contudo, ele vai para fora e… este fim de semana é a nossa festa de noivado.

Natasha franziu o sobrolho. Izzy era uma pessoa prática, porém, tinha a sua dose de vulnerabilidade. Estava no trabalho naquele momento. Trabalhava com a sua prima Pepper num escritório moderno, onde qualquer um podia ouvir as conversas dos outros.

– Ouve… Vejo-te na sexta-feira e conto-te tudo. Faz uma boa viagem – Izzy desligou.

«Está bem», pensou Natasha. Esperaria até sexta-feira.

Enquanto isso, não tinha sentido pensar no casamento repentino da sua amiga. Ela tinha de acabar a apresentação.

Voltou para o computador e, com um movimento brusco, carregou no teclado e pintou o gráfico de violeta.

A sala do trono do palácio era magnífica. O emir de Saraq estava sentado numa cadeira com brocado francês, mais apropriada para Versalhes do que para um palácio do Oriente. Indicou ao recém-chegado que se sentasse num sofá minimalista sueco. O emir tinha-o encomendado pessoalmente.

– Tu não mandas em mim, avô! – exclamou o recém-chegado, sem emoção. Era alto. Usava uma túnica branca sem uma única ruga. Não se sentou.

– Finalmente, estás cá… – disse o emir de Saraq, com um toque de desafio.

– De momento…

Os seus olhares cruzaram-se. O emir olhou para ele com ferocidade, no entanto, o seu opositor não deixava transparecer emoção alguma. Estava muito bem treinado para esconder os sentimentos. Fazia-o muito bem.

O primeiro a desviar o olhar foi o emir.

– Não vamos discutir, Kazim. Isto é importante – replicou o homem mais velho, num tom condescendente.

O seu avô não costumava empregar aquele tom para o acalmar, contudo, o emir era um ator consumado, pensou Kazim. Teria de permanecer alerta.

– Trata-se de outro casamento combinado? – perguntou Kazim.

Os olhos do emir encheram-se de fogo, no entanto, controlou-se imediatamente.

– Não. Aceitei a tua vontade. Decidirás tu mesmo quando te casarás.

– Se me casar… – corrigiu Kazim.

O seu avô também não gostava daquilo.

– Se te casares – respondeu, resistente, o emir.

– Eu decidirei com quem me casarei – acrescentou Kazim, com calma.

– Está bem – concordou o emir, entredentes.

O seu neto assentiu lentamente e olharam-se como dois inimigos.

O emir disse qualquer coisa em voz baixa e Kazim decidiu não o ouvir. Às vezes, era a única coisa que podia fazer no jogo de xadrez que era a relação entre eles.

– Quebraste todas as tradições e não quiseste ouvir ninguém… No entanto, cumpres as tuas responsabilidades.

– Obrigado – Kazim franziu os lábios.

O emir parou de murmurar e alisou a túnica nos joelhos.

– Queria ver-te porque recebemos um aviso.

Kazim olhou para ele, preocupado.

– Referes-te a ameaças? Contra ti?

O emir permitiu-se um sorriso tímido, antes de responder:

– Não. Contra ti.

Kazim não respondeu. O ar encheu-se de eletricidade.

– Tu também descobriste – retorquiu o emir.

Kazim sentiu-se perturbado. Não quisera que se notasse, contudo, o seu avô era muito observador. Ou estaria ele a perder o jeito?

– Há sempre loucos. As ameaças herdam-se em conjunto com o território.

– Tu estás a tornar-te um alvo para eles – explicou o seu avô, com aborrecimento.

Kazim suspirou. Aquilo não era uma novidade. O seu avô queria que ele estivesse são e salvo na sua casa em Saraq e não a viajar de um lado para o outro para participar em conversações de paz.

– Esse teu Conselho de Reconciliação Internacional é uma grande ideia… – o emir fez uma pausa. – Dentro de cinquenta anos.

– Não temos cinquenta anos – ripostou Kazim.

Já tinham tido aquela discussão azeda muitas vezes, porém, por uma vez, o emir não queria ganhar a discussão.

– Isso não importa.

– O quê? – perguntou Kazim, espantado.

– Estás numa lista de assassinatos – anunciou o seu avô, sem rodeios.

– Os teus espiões são muito eficientes – respondeu Kazim, com educação.

O emir olhou para ele e comentou:

– Tens uma atitude muito fria e respeito isso.

– Tomo precauções razoáveis – Kazim encolheu os ombros.

– Não, não tomas.

– O quê? – Kazim pestanejou.

– Ao dispensares o serviço de segurança e os teus empregados durante um fim de semana inteiro, não estás a tomar precauções razoáveis – replicou o emir.

Aquilo foi um golpe para Kazim.

– Não é isso que vais fazer? – perguntou o seu avô.

– O conceito de vida privada é desconhecido para ti, não é? – perguntou Kazim.

– Eu tento ter a minha.

– Mantendo a vigilância vinte e quatro horas por dia?

O emir ignorou-o.

– Se se tratar de uma mulher, trá-la para cá, onde estará segura. Podes ter o Palácio da Sultana e toda a privacidade que quiseres – sugeriu o emir.

– Não se trata de uma mulher – respondeu Kazim, tentando controlar-se.

O emir sorriu.

– Seria melhor que fosse. Trabalhas demasiado.

Ambos sabiam que há anos que Kazim não visitava os aposentos do palácio destinados a ele. Tinha chegado diretamente do aeroporto para aquela reunião com o seu avô e o emir sabia que o jacto devia estar à sua espera.

O emir sabia que Kazim fazia sempre o que queria quando pensava que tinha razão. No entanto, aquilo era mais importante do que uma luta de vontades. Naquele momento, o emir não era mais do que um homem preocupado com a segurança do seu neto.

– Pelo menos, mantém o serviço de segurança em Serenata Place – o emir quase suplicou.

Kazim continuava incomodado com a ideia de que o espiassem.

– Serei eu a decidir como organizar uma festa com amigos.

O seu avô explodiu.

– Amigos! Que tipo de amigos quer pôr-te em perigo?

– Amigos normais.

– Ora!

Contudo, havia um tom de desespero sincero na voz do emir.

Kazim sentou-se no sofá e inclinou-se para a frente.

– É só um fim de semana! – exclamou, com tom mais suave.

– A duração é irrelevante – respondeu o emir. – Um assassino só precisaria de um minuto para te matar – olhou para Kazim como se o odiasse.

– Pedirei a Tom que faça uma inspeção minuciosa antes de os convidados chegarem – o emir fez um som de desprezo. – Não quero que homens com auriculares e paranoia profissional arruínem a festa de noivado do meu melhor amigo – respondeu Kazim, com irritação.

– Uma festa! Verificaste sequer a lista de convidados?

– Dominic é meu amigo – respondeu Kazim, com dignidade.

– Imaginei que não o fizesses…

– Avô, tenta compreender. Dom e eu fomos escalar juntos. Ele teve a minha vida nas suas mãos e eu a sua. É claro que não controlei os seus amigos.

– Cancela a festa!

– Fá-lo-ias no meu lugar? – Kazim conhecia muitas histórias da juventude do seu avô. A coragem e a lealdade eram pilares do emir, e a teimosia também. – Tudo o que sou herdei-o dos meus ilustres antepassados – murmurou, com expressão de descendente dedicado.

O emir semicerrou os olhos.

– Achas-te muito esperto. Porém, um dia arrepender-te-ás.

Os olhos de Kazim, escuros como os do emir, brilharam com humor.

– Quando acontecer, farei com o que saibas imediatamente – garantiu ao seu avô e foi-se embora.

O seu assistente pessoal estava à sua espera junto do veículo com ar condicionado. Kazim aproximou-se do carro com movimentos bruscos que esvoaçavam a sua túnica.

– Como correu?

– O meu avô tem um espião na minha casa – contou Kazim, entredentes. – Quer encher Serenata Place de seguranças. Dá-me as chaves.

O coração de Martin encheu-se de tristeza. Contudo, deu-lhe as chaves. Geralmente, Kazim agia com sensatez, no entanto, os encontros com o seu avô tendiam a tirá-lo do sério.

Martin abanou a cabeça.

– Este é o fim de semana de Dominic, não é?

– Sim.

– Bom, o emir tem um pouco de razão.

Quando estava prestes a sentar-se ao volante, Kazim parou.

– Ouve, Martin. Passei a vida rodeado de guarda-costas. Por uma vez, quero dar uma festa como um homem normal.

Martin trabalhava para Kazim há muito tempo. Sabia quando o seu chefe não ia mudar de ideias. Naquelas alturas, Kazim era inamovível.

Martin suspirou.

– A decisão é tua.

Meteram-se no carro e Kazim ligou o motor.

– Se não puder confiar num homem com quem vou escalar, não posso confiar em ninguém.

Martin era compreensivo, porém, o seu trabalho era recordar a Kazim a dura realidade.

– Não escalaste com a noiva dele. Nem com as amigas dela.

Kazim olhou para ele, surpreendido.

– Achas que os Filhos de Saraq seriam capazes de enviar uma aficionada da moda para me assassinar?

Martin riu-se.

– Dito assim, não parece muito provável – respondeu.

Kazim arrancou com o carro. Depois, com um brilho atrevido, exclamou:

– A única coisa que posso dizer é que é melhor que seja loira!

Continuou com aquele estado de espírito durante toda a viagem para Londres, para desespero de Martin e de Tom Soltano, o chefe de segurança americano. Martin Page estava a tentar controlar-se com toda a sua força de vontade, contudo, Kazim disse algo que o fez explodir.

– Estás a brincar, não estás?

Kazim levantou o olhar da pasta que estava a analisar e arqueou os sobrolhos.

– Nunca brinco com a agenda.

Era verdade. Nos últimos anos, Kazim tinha percorrido o mundo, dedicando o seu intelecto e a sua calma aos conflitos do seu país. Tinha uma agenda séria, com muitas responsabilidades. Porém, não costumava divertir-se muito.

Martin, que era quem a organizava, sabia-o muito bem.

Levantou-se e estendeu diante de Kazim uma folha do tamanho de um póster. Ali estavam registados, dia a dia, os seus compromissos dos próximos seis meses. Martin apontou para a semana de que Kazim tinha estado a falar e disse:

– Olha… Não tens tempo.

Kazim permaneceu sereno, como sempre. Era uma das suas características mais irritantes.

– Então, arranjarei tempo.

Martin virou-se e olhou para ele com impaciência.

– Penso que, quando consegues ser bem-sucedido em negociações de paz, é unicamente por teimosia – brincou Martin.

Tom Soltano riu-se, contudo, em seguida começou a tossir.

Kazim replicou com serenidade:

– Há sempre uma solução.

No entanto, Martin não estava decidido a calar-se.

– Olha para este mês. Nova Iorque, Paris, Saraq, Indonésia, Turquia. Nem sequer podes ter a certeza de conseguir assistir ao casamento de Dominic e muito menos de conseguir organizar a festa!

Kazim sorriu. Tinha um bonito sorriso, que fazia as mulheres derreterem-se.

Martin olhou para ele com desconfiança.

– Mas eu não vou organizar o casamento de Dominic – comentou Kazim. – Pediu-me que seja o padrinho. Só isso. Só vou segurar as alianças. Quanto tempo pode levar isso?

Martin olhou para ele, sem conseguir falar. O americano Tom era mais direto.

– Alguma vez foste a um casamento inglês?

Kazim al Saraq era brilhante e poderoso, com um perfil arrogante e suficientemente rico para assumir que as pessoas não discutiriam com ele. Contudo, os outros dois homens eram os seus assistentes mais próximos. Não tinham em conta os seus poços de petróleo, nem o seu perfil.

Segundos depois, Kazim ficou à defesa.

– A um casamento inglês? Naturalmente, já fui a um.

– A um grande? Com tias e chapéus? E mães a chorar? – insistiu o seu conselheiro de segurança.

– O casamento não é assim tão diferente nas várias culturas. As mães com lágrimas são típicas desde Bombaim a Baffin Island.

Os três refletiram a respeito daquilo. Depois, Tom comentou:

– Suponho que tenhas razão em relação às mães. Porém, o padrinho inglês é único. Faz mais do que segurar as alianças, acredita. Foi o que eu fiz.

– Ouve-o… – interveio Martin.

Kazim sorriu, resistente.

– Está bem. Continua. Mete-me medo.

Os outros dois olharam-se.

– Bom – começou Tom, – és responsável pelo noivo. Responsável! Tens de lhe organizar a festa da sua vida, uma despedida de solteiro inesquecível!

– No dia seguinte, tens de fazer com que recupere a sobriedade e tens de o levar à igreja – acrescentou Martin.

Kazim fez um gesto displicente.

– Dominic vai estar a treinar para a expedição ao Polo Sul. Não haverá bebedeiras. Portanto, não será preciso fazê-lo recuperar a sobriedade – explicou Kazim, com um brilho de entusiasmo nos olhos que os seus colaboradores não viam há muito tempo. – Terão de me assustar mais.

– Está bem – concordou Martin. – Que tal isto? O padrinho tem de dispor os lugares na igreja, de controlar os pajens e as damas de honor…

– Ou seja, organizar o espetáculo – resumiu Kazim, ainda tranquilo. – Não há problema, consigo fazê-lo. O que mais faço na vida para além disso?

Martin revirou os olhos.

– Normalmente, dizes a Martin e a mim o que queres fazer, e somos nós que organizamos tudo – comentou Tom.

– Isso é verdade – concordou Martin.

– Ser o padrinho é um compromisso, Kazim. Não te aconselho. Será um objetivo.

Martin assentiu.

– Vais ter de arregaçar as mangas. Não poderás escapar. Não poderás delegar a ninguém – Kazim ficou calado. – Terás de fazer um discurso – continuou Martin.

– Estou sempre a fazer discursos! – protestou Kazim.

– Não como este – respondeu Martin. – Terás de contar piadas.

– Conheces histórias divertidas sobre Dominic Templeton-Burke para fazer rir um grupo de estranhos, Kazim? – perguntou Tom, com curiosidade.

Pela primeira vez, Kazim ficou pálido. Os seus companheiros notaram-no com satisfação.

– E as damas de honor? – perguntou Martin, que começava a divertir-se. – Deves acompanhar a madrinha ao altar. Terás de dançar com ela sempre que a vires sozinha…

– Controlar as coisas para que as crianças não ataquem os presentes de casamento – acrescentou Tom, que fora padrinho várias vezes. – Apresentar as pessoas, manter as duas sogras a distância suficiente para que não se matem, afastar os sogros da garrafa de conhaque e despedires-te do casal feliz com um sorriso, assegurando-te primeiro de que ninguém estragou o seu carro.

Kazim pareceu abatido. No entanto, riu-se, um pouco incomodado.

– Estão a exagerar.

Martin abanou a cabeça.

– Não há exagero nenhum.

Kazim endireitou os ombros.

– Tom foi padrinho e sobreviveu. Não pode ser assim tão mau.

Os outros dois homens olharam-se.

– É pior! – exclamaram em uníssono.

– Não acredito que consigas estar ao lado de Dominic no altar e, depois, desaparecer. Não é possível – afirmou Tom.

– Telefona-lhe e diz-lhe que arranje outro padrinho – sugeriu Martin, sem se rir. – É a única solução.

– Dei a minha palavra a Dom – respondeu Kazim, com o queixo levantado.

– Sim, porém, não tinhas pensado bem – ripostou Tom.

– Dei a minha palavra – repetiu Kazim.

Martin sabia que não havia mais nada a dizer. Quando Kazim prometia alguma coisa, não havia nada que o fizesse mudar de ideias.